segunda-feira, 14 de junho de 2010

Era uma vez uma Mata Atlântica...


Trilha aberta na Mata Atlântica entre Minas e São Paulo

A Mata Atlântica brasileira já ocupou 136 milhões de hectares do território do país, mas desde o evento do “descobrimento” vem sendo dilapidada pelo “desenvolvimento” econômico da civilização ocidental. A seiva da árvore de Pau Brasil foi cobrir de vermelho, reis e cardeais no passado da Europa, as naus carregavam toneladas de toras da ybirapitanga (madeira vermelha em tupi) como lastro na viagem de volta deixando aqui algumas pedras do lastro original usado na travessia do Atlântico.




Grimpeirinho na Mata Nebular das encostas da Serra Geral
Leptasthenura striolata

Como conta Eduardo Bueno em 1531 o Barão de Saint Blanchard abriu um processo Judicial sobre o seu navio La Pélerine capturado em Málaga por Portugal ao voltar do Brasil. No processo consta um rol das mercadorias confiscadas além do próprio navio, ele carregava: 300 toneladas de Pau Brasil, 300 “quintais” de grãos do Novo Mundo, três mil peles de onça e outros animais, três mil ducados de ouro, mil ducados em óleos medicinais e 600 papagaios sabendo algumas palavras em francês. Hoje fico a pensar sabe-se lá de que espécies eram estas aves descritas genericamente como papagaios, talvez alguma de ocorrência endêmica que hoje não exista mais...



Broto de samambaia ao lado da trilha
Depois do impacto do “descobrimento” os ciclos econômicos, do Ouro, do Cacau e da Cana-de-açúcar, terminaram de fazer o serviço do desmatamento que naqueles tempos deveria significar “o progresso e a civilização” sobre a Jângal tropical.
No passado a Mata Atlântica era contínua com a Floresta Amazônica e cobria todo o litoral brasileiro do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte, Chegava até a Argentina e o Paraguai, nas regiões Sul e Sudeste, cobrindo importantes trechos de serras e escarpas do Planalto Brasileiro

Hoje existem apenas 6,98%* de Mata Atlântica no Brasil. E em cinco anos (2000 – 2005 por exemplo), foram desmatados 95.066 hectares, equivalente a 8 mil Maracanãs (que já foi o maior estádio do mundo).

Já foi a segunda maior floresta tropical em ocorrência e importância na América do Sul, em especial no Brasil. Encontra-se hoje extremamente reduzida, sendo uma das florestas tropicais mais ameaçadas do globo, apesar disso, seu clima subtropical lhe confere uma biodiversidade de ecossistema das maiores do planeta.

Atualmente no Brasil a Mata só sobrevive em algumas ilhas florestadas cercadas por campos de gado ou lavouras diversas e até monocultura como a soja, os cítricos e a cana-de-açúcar. Em alguns lugares do interior ainda se faz aguardente de cana do modo como se fazia há 400 anos atrás pelos colonizadores a Pinga - a tradicional Cachaça brasileira.

Alguma coisa boa esse desmatamento todo tinha que ter feito...


Saíra preciosa habita a Mata Atlântica sul.
Tangara peruviana

Em alguns parques e montanhas de quase 2 mil metros da Serra Geral, ao longo da costa brasileira, a mata ainda sobrevive em largas extensões florestadas.

É também considerado Mata Atlântica todo o perfil da cobertura vegetal da costa atlântica brasileira e suas serras; isso envolve ambientes diversos como: Campos de Altitude, Floresta Nebular das encostas da Serra Geral, Mata de Araucárias e Florestas Úmidas com árvores de 20 a 30 metros de altura com grande diversidade de parasitas como cipós, bromélias e orquídeas. São também parte deste conjunto as vegetações de restingas e mangues que formam as bordas da floresta quando ela encontra o oceano que lhe empresta o nome.

Papagaio brasileiro - Amazônia aestiva - ocorre no Brasil central,
mas já habita a Ilha de Santa Catarina.
Cada vegetação desse conjunto possui uma avifauna característica e diversa.


As aves pescadoras, é claro, estão nos manguezais ou nas restingas costeiras, mas em meus passeios pelo interior das bacias hidrográficas catarinenses tenho encontrado os Martim-pescadores, o Biguá (cormorán) e as diversas garças também longe da costa.

Os pássaros canoros como o gaturamo, capitão-do-mato, sabiás e outros habitam as áreas florestadas, que são sobrevoadas constantemente por Urubus (o rei e o cabeça-vermelha), gaviões grandes e pequenos, notavelmente o Gavião-pega-macaco e a Harpia os maiores que eu bem gostaria de avistar e/ou fotografar um dia.
Beija-flor-de-fronte-violeta -Thalurânia glaucopis

A coruja buraqueira é outra que encontramos no campo na cidade, em dunas de areia e em pastagens como também o Quero-quero e alguns íbis. E aonde houver flores os cintilantes Beija-flores!

É importante defender a criação de corredores ecológicos para que os animais dessas ilhas de Mata Atlântica possam trocar material genético preservando assim a saúde das populações e aumentando a área de território para algumas espécies a beira da extinção simplesmente pela restrição espacial de sua dinâmica populacional.
Tucano-de-bico-verde - Ramphastus dicolorus

Com essa diversidade de espécies e de ambientes diferenciados, o conjunto da Mata Atlântica que restou forma alguns “buquês” riquíssimos de biodiversidade, mas cada vez mais arrochados pelo laços limitadores que nós, enquanto civilização criamos.


Um arquipélago de florestinhas no que antes seria uma exuberante e grandiosa cobertura verde.

* (SOS Mata Atlântica/INPE)



Neno Brazil
Ilha de Santa Catarina Junho 2010
Passarazzi