O artigo abaixo foi provocado, e esta é a palavra, pelo editor do Jornal veneziano "Il Ridotto" Luca Colferrai para a retomada do Jornal agora mais interativo e voltado para internet.
Costumava publicar no "Il Ridotto" artigos sobre aves brasileiras ou sudamericanas e as fotos passarazzI disponíveis no blogi, mas este artigo sai um pouco do costumeiro tema.
Falar de energia no Brasil e no mundo de hoje para o público do Il Ridotto foi una vera sfida!.. e ainda bem que o Luca traduz e adapta os meus textos - grandíssimo Luca!
Mas falar do planeta é pensar em conservação, o que inclui a avifauna, ou nos arriscamos a sermos superficiais, então espero que apreciem o que segue:
Reflexões sobre energia no Planeta Singular
Nasci no Brasil em 1959, lá se vão algumas décadas. Quando criança era curioso por mapas, informações geopolíticas e enciclopédias, as clássicas e as em fascículos semanais.
Por isso me lembro bem de certos detalhes da história que formam uma perspectiva da evolução da questão ambiental e do modelo energético brasileiro. E digo isso por não ser especialista nestes assuntos e sim um curioso sobre o planeta no qual meus pés pisam todas as manhãs e a consciência de estar numa zona de conforto - para seres como nós - raríssima em todo o universo estelar: a nossa atmosfera!
Anúncio do Banco do Brasil dos anos 70. Nada contra o BB de hoje mas retrata a mentalidade de uma época que no geral não mudou tanto assim, Belo Monte no Xingú que o diga. |
Na minha infância era comum ler a expressão “inferno verde” nas antigas revistas semanais brasileiras para descrever a região amazônica, e até hoje só conheço a região de livros, documentários e revistas, na verdade em 1995 sobrevoei a floresta indo para Costa Rica. Mas sempre acompanho com carinho as discussões nacionais sobre essa aparentemente dantesca floresta.
A expressão foi cunhada por espanhóis durante a conquista do novo mundo para descrever suas agruras nas expedições através da jângal em busca do ouro da lendária “Manoa do Eldorado”.
Nos anos setenta era título de reportagem “Rodovia Transamazônica - desbravando o inferno verde”. Essa visão de uma floresta inimiga do avanço e desenvolvimento da civilização ocidental – e oriental também, pois imagino que as florestas russas e chinesas sofreram do mesmo – tem os seus reflexos até o dia de hoje.
Uma floresta inundada para produzir energia elétrica “limpa” tem uma lógica utilitária aparente, mas numa visão mais, digamos, holística do problema temos que considerar o impacto que criar um lago como deuses engenheiros pode provocar ao entorno ainda florestado com conseqüências ambientais rio abaixo e rio acima.
Chama atenção os abalos sísmicos ocorridos na região ao fim do preenchimento do gigante lago da hidrelétrica chinesa de Três Gargantas - a maior do mundo...
Quanto aos lagos existem estudos sobre o gás expelido pelo aprodecimento da vegetação submersa nos enormes novos corpos d´água criados que colabora com o climate change em que hoje vivemos.
Até hoje trabalhadores arriscam a vida tirando madeira com equipamento precário de mergulho e motoserras subaquáticas no lago da Hidrelétrica de Tucuruí na amazônia e outras obras começadas ainda na ditadura militar brasileira. Se ainda existem árvores aproveitáveis submersas deve existir muito mais material orgânico apodrecendo no fundo desse lagos todo esse tempo. Alguns cientistas e ONGs internacionais alertaram sobre isso na mídia mundial, mas parece que falam de um outro planeta, pois não há repercussão política, administrativa ou legal.
Então qual é a opção? Energia Nuclear?
Na virada dos 1970 para os 1980 o Brasil enfrentou uma pressão tremenda para não realizar o acordo nuclear Brasil-Alemanha que acabou gerando as usinas de Angra dos Reis.
Este paraíso da costa fluminense (Rio de Janeiro), conta hoje com este “câncer” localizado na sua belíssima paisagem costeira. Me lembro de uma matéria na época sobre tubos comprados da Westinghouse e nunca utilizados na obra, não estavam nem nos projetos, depois de concretizada a compra os EUA diminuíram a pressão e assinou-se finalmente o tal acordo.
Sabemos que a proximidade com o mar serve também como plano B para a necessidade de mais água para um eventual resfriamento do material radiativo numa emergência, mas os eventos recentes nas usinas costeiras japonesas nos fazem pensar que, apesar de não termos histórico de tisumamis na costa brasileira, algum evento extraordinário pode acontecer e não teremos o preparo e a organização social nipônica para enfrentar as conseqüências.
É também de causar espanto que o projeto japonês contivesse um erro tão básico, para uma terra sujeita a terremotos, como colocar as suas bombas de água de resfriamento emergencial das piscinas - motores diesel - abaixo da linha d´água de um possível tisunami.
Mesmo algumas mentes verdes, que pensam o meio ambiente de uma maneira sofisticada, como James Lovelock da Hipótese Biogeoquímica (Gaia), já começavam a aceitar a energia nuclear na equação da geração de energia como uma alternativa menos agressiva ao planeta e sua atmosfera.
É claro que o desejável seria uma tecnologia nuclear com uma solução para os seus resíduos radiativos e que não fosse semelhante a Tchernobyl ou mesmo Fukushima, mas parece que não conseguiremos tão cedo melhorar investimentos e pesquisas nessa área até por conta destes dois exemplos ainda frescos na cabeça dos eleitores.
Existem idéias mais interessantes para geração de energia limpa e sustentável ambientalmente, mas que não contam ainda com investimento relevante dos atores do mercado de energia. Estes players estão apenas acompanhando a tendência da sociedade contemporânea, e até de movimentos como o consumo consciente, slow food, fazendo ações que somente beiram o marketing.
Mas a energia eólica vem ganhando espaço no Brasil com alguns parques em regiões como o nordeste brasileiro aonde o vento é constante nesta faixa tropical e até uns poucos exemplos também aqui na região sul.
Fala-se também em turbinas hidráulicas colocadas no fundo de rios caudalosos assim gerando energia eletromecânica da força do rio sem precisar construir uma pirâmide moderna de cimento armado para criar mais um lago desnecessário ao planeta.
Mas vejo cada vez mais claro o surgimento de um princípio de autonomia de cédulas individuais gerando sua própria energia através de unidades eólico-voltaicas, ou a nova febre - o revolucionário gerador magnético - dando conta de toda energia em cada habitação. Evidente que isso implicaria numa mudança mundial radical no modelo econômico e industrial que existe hoje com reflexos políticos e sociais. Oestabilishment é muito conservador na hora de garantir seus investimentos, é a guerra comodities x papel moeda...
Poucos lembram, mas a liderança brasileira no uso do etanol como combustível de massa, com o país até hoje conseguindo manter uma logística para oferecer o combustível no varejo com preços competitivos aos derivados do petróleo, é fruto de uma circunstância não muito democrática.
Naquela época vivia-se as conseqüências da crise do petróleo de 1973 e o chefe do SNI, Gen Ernesto Geisel então incumbiu o Ministro das Minas e Energia Sigeaki Ueki para desenvolver uma solução brasileira para o abastecimento da frota de veículos crescente do país.
Os primeiros FIAT brasileiros à álcool (google) |
O programa de desenvolvimento dos motores à ácool idealizado pelo físico José Bautista Vidal e pelo “pai” do motor à álcool Urbano Ernesto Stumpf realizou suas pesquisas no laboratório de motores para aviação da FAB em Campinas SP.
Apesar de o projeto ser tratado como secreto pelos militares a notícia vazou e os grandes fabricantes de veículos pressionaram o então já Presidente Gen. Ernesto Geisel para parar com as pesquisas do projeto ProÁlcool pois iria destruir com os motores dos carros nacionais. O Presidente aciona seu ministro da área que alerta o Secretário de Tecnologia Industrial, Bautista Vidal ,que liderava as pesquisas já muito avançadas e não queria ver o projeto à perder. Este genial brasileiro espertamente convoca uma grande coletiva de imprensa sobre o ProÁlcool contando com a presença dos representantes das montadoras de veículos para debater com ele. Como as montadoras aceitaram achando que em maioria iriam massacrar o ProÁlcool compareceram, mas ele apresentou motores funcionando à meses com álcool (etanol), todos ali em bancadas, os motores Ford, Volkswagem, Chevrolet e Fiat, suas próprias marcas..
Os representantes das montadoras abandonaram a apresentação e o governo acabou implantando o ProÁlcool em seguida ainda em 1975 fazendo um papel louvável, para uma ditadura, na sustentabilidade e na solução da equação energética do planeta.
Na democracia sindical de hoje as discussões sobre o novo Código Florestal brasileiro são obscuras, e a redação do Dep Aldo Rebello (PCdoB) surgiu de uma comissão compostas de deputados majoritariamente da bancada dita ruralista (agronegócio e agricultura familiar) e logo armou-se uma disputa com a bancada dita “verde”, a verdade é que virou uma discussão pretensamente do bem contra o mal. Ninguém, que discute este tema nacionalmente, leu o tal novo código, então vira um debate inútil onde o único assunto que não é discutido é o principal: o que devemos fazer com as nossas florestas diante do quadro de sete bilhões de habitantes no planeta a maioria vítima uma cultura consumista do desenvolvimento cego e inconseqüente? O governo não consegue fazer cumprir o código atual, então vão mudar e fazer um novo para que? Difícil que seja para preservar mais...
O cientista da Terra, Antônio Donato Nobre, costuma ensinar em suas palestras que a amazônia funciona ou respira como uma enorme chaleira que emite uma quantidade monstruosa de 20 bilhões de toneladas de água por dia como vapor na atmosfera para formar os "rios voadores" de nuvens sobre a imensa região florestada. Mas se realmente em vez de floresta fosse uma chaleira elétrica gigante, a energia necessária para fazer esses bilhões de litros d´água evaporar seria de 50.000 Itaipus ou a soma equilalente em quilowatts a um custo astronômico enquanto a floresta faz esse "serviço" de graça...
O modelo atual concentra muita energia e recursos em um só local - grandes hidrelétrica, usinas de carvão, diesel ou nuclear - próximo das cidades onde existe a demanda de energia. Então é neste lugar, que os empreiteiros vão escavar, aterrar, bloquear com uma gigantesca muralha de concreto (uma montanha moída) e finalmente alagar, poluir com fumaça ou enterrar lixo atômico, neste lugar que talvez possa ser o habitat daquela borboleta lindamente azul das florestas brasileiras que parece um Yves Klein voando, mas na verdade não é nem azul, obtém sua cor de um efeito fotóptico sofisticadíssimo da superfície de suas asas – cristais fotônicos - que só recentemente conseguiram descobrir ao estuda-la no mais atual e poderoso microscópio eletrônico. Este efeito está gerando estudos que podem ajudar a tecnologia do futuro próximo ajudando a humanidade a avançar. As plantas deste santuários úmidos possuem elementos bioquímicos que são poderosos fungicidas pois sem eles não teriam sobrevivido como espécie até os dias de hoje. E todo este maravilhoso arsenal de tecnologias ainda desconhecidas para nós foi desenvolvido gratuitamente, durante milênios, pelo grande laboratório tecnológico da natureza que são as florestas deste singular planeta iluminado pelo eterno e gratuito astro, o Sol.
por
Neno Brazil
Cacupé, Ilha de Santa Catarina
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